Epicrates crassus

Texto e imagem por Bruno F. Fiorillo

As salamantas, também conhecidas por jibóias arco-íris, tem este nome por seu brilho iridescente, gerado pela interação da luz com as escamas queratinizadas levando a uma aparência furta-cor no dorso, como um arco-íris.

Existem diversas razões pelas quais uma serpente pode apresentar escamas iridescentes. Por exemplo, a estrutura física de escamas iridescentes pode ajudar a reduzir o atrito com o substrato e a repelir a água. Além dessas supostas funções, estruturas iridescentes podem ser particularmente resistentes. No entanto estas hipóteses ainda precisam ser testadas.

Epicrates crassus é uma espécie da família Boidae (Squamata: Serpentes), mesma família da jibóia comum (Boa constrictor), e ocorre em formações abertas da Argentina, Bolivia, Brasil e Paraguai. Assim como outras jiboias arco-íris do gênero Epicrates, até recentemente a espécie era considerada subespécie de E. cenchria que tem distribuição restrita a biomas florestais nas regiões Amazônicas, com pequenas populações na Mata Atlântica. Um trabalho realizado na porção sul do Cerrado (Estação Ecológica de Santa Bárbara) relatou que indivíduos de E. crassus foram encontrados em ambientes localizados em extremos opostos do gradiente da vegetação, ou seja, desde áreas campestres abertas até florestais. Tal informação faz sentido, uma vez que a distribuição da espécie cobre regiões em contato com a Floresta Amazônica, ocorrendo inclusive em simpatria com E. cenchria.

O tipo de dentição das jibóias e salamantas é áglifa, uma característica típica da maioria das serpentes não peçonhentas. Isto quer dizer que essas espécies não apresentam dentes inoculadores de veneno. A alimentação da salamanta do Cerrado é constituída principalmente por aves e pequenos mamíferos e sua atividade é tanto diurna como noturna.

A reprodução da espécie é sazonal, com picos entre novembro e março e a fecundidade das fêmeas varia de 8 a 22 embriões por ninhada. Os machos da espécie podem aderir ao combate durante o outono (março a junho), quando o tamanho dos órgãos reprodutivos aumenta, junto com o aumento na produção de testosterona. Durante os rituais de combate, os indivíduos se aproximam e avaliam uns aos outros antes de se alinharem e entrelaçarem. Em seguida ambos competem para estabelecer dominância, constringindo e tentando constantemente manter a cabeça do oponente mais baixa.

Ao serem manuseadas, ou mesmo pela presença de uma possível ameaça (ex. seres humanos), estas serpentes podem desferir ataques, esconder a cabeça, enrolar a cauda (exibindo-a) e realizar descarga cloacal. Estes comportamentos defensivos podem variar quanto ao tipo de predadores aos quais se destinam. Desferir ataques, sendo geralmente utilizados em último caso quando o animal é acuado. Exibir a cauda e esconder a cabeça supostamente serviriam para proteção física de órgãos vitais. A descarga cloacal seria uma alternativa de afastar predadores que utilizam sinais químicos para localizar suas presas (e.g. mamíferos).

Apesar de amplamente distribuída e não ser considerada uma espécie ameaçada, as salamantas desta espécie podem ser muito visadas por colecionadores devido ao elevado valor comercial proporcionado por sua coloração chamativa, o que possivelmente contribui para que seja um alvo do tráfico de animais selvagens. A destruição dos hábitats no Cerrado também coloca E. crassus em risco, já que se trata de uma espécie endêmica do bioma.

Glossário

  1. Simpatria: condição em que a distribuição geográfica de duas ou mais populações se superpõe sem que ocorram cruzamentos entre indivíduos das diferentes populações.

Revisão do texto por

Dr. Josué Anderson Rêgo Azevego. Email: josueanderson21@gmail.com RG
Instituto de Pesquisas da Amazônia, Manaus, AM, Brasil.
M.Sc. Rafael Carlos Benetti Paredero. Email: rafaparedero@gmail.com CL
Instituto Butantan, Laboratório Especial de Coleções Zoológicas, Instituto Butantan, São Paulo, SP, Brasil.

Referências

Alves RRN, de Araújoa BMC, Policarpoa I da S, Pereiraa HM, Borgesa AKM, Vieira WL da S, Vasconcellos A (2019): Keeping reptiles as pets in Brazil: Ethnozoological and conservation aspects. Journal for Nature Conservation 49(2019): 9-21. [Link]

Cassimiro J, Palmuti CFS, Bertoluci J (2010): Epicrates cenchria (Salamanta; Rainbow Boa). Diet. Herpetological Review 41: 501. [Link]

Doucet SM, Meadows, MG (2009): Iridescence: a functional perspective. Journal of The Royal Society Interface 6: S115–S132. [Link]

Edmunds M (1974): Defense in Animals, First Edition. Longman Group Limited Press, Burnt Mill.

Fiorillo BF, Maciel JH, Martins M (2021): Composition and Natural History of a Snake community from the southern Cerrado, southeastern Brazil. Zookeys 1056: 95-147. [Link]

Fiorillo BF, Martins M (2021): Herpetofauna da Estação Ecológica de Santa Bárbara: Guia Ilustrado. Herp Trips, São Miguel Arcanjo. [Link]

Gans C, Baic D (1977): Regional specialization of reptile scale surfaces: relation of texture and biologic role. Science 195: 1348–1350. [Link]

Gower DJ (2003): Scale microornamentation of uropeltid snakes. Journal of Morphology 258: 249–268. [Link]

Marques OAV, Eterovic A, Nogueira C, Sazima I (2015): Serpentes do Cerrado: Guia Ilustrado. Holos, Ribeirão Preto. [Link]

Passos P, Fernandes R (2008): Revision of the Epicrates cenchria complex (Serpentes: Boidae). Herpetological Monographs 22: 1–30. [Link]

Pizzatto L, Manfio RH, Almeida-Santos SM (2006): Male-male ritualized combat in the Brazilian rainbow boa, Epicrates cenchria crassus. Herpetological Bulletin 95: 16–20. [Link]

Pizzatto L, Marques OAV (2007): Reproductive Ecology of Boine Snakes with Emphasis on Brazilian species and a Comparison to Pythons. South American Journal of Herpetology 2: 107–122. [Link]

Pizzatto L, Marques OAV, Facure K (2009): Food habits of Brazilian boid snakes: overview and new data, with special reference to Corallus hortulanus. Amphibia-Reptilia 30(2009): 533–544. [Link]

Sawaya RJ, Marques OAV, Martins M (2008): Composição e história natural das serpentes de Cerrado de Itirapina, São Paulo, sudeste do Brasil. Biota Neotropica 8(2): 127–149. [Link]